O preço da comunicação interpessoal

 

Em 2024, a plataforma Gramarly, uma inteligência artificial responsável por revisão de textos, publicou uma pesquisa intitulada State of Business Communication: The Path to Productivity, Performance, and Profit (em tradução livre, Estado da Comunicação Empresarial: O Caminho para a Produtividade, Desempenho e Lucro). A pesquisa mostrou o impacto financeiro da comunicação interpessoal ineficaz nas organizações. Importante ressaltar que a pesquisa não tratou das estratégias de comunicação empresarial das corporações, mas da comunicação individual entre as pessoas, independentemente do nível hierárquico e com destaque para as lideranças.

Os resultados foram significativos. Segundo a pesquisa, as perdas de tempo, os retrabalhos e os conflitos gerados podem ocasionar impactos financeiros ao longo de um ano, equivalentes a 4% do PIB dos EUA, onde a pesquisa foi realizada. O estudo também afirma que melhorar a comunicação interpessoal pode aumentar a produtividade em até 72% e resolver até 63% da insatisfação dos clientes.

A pesquisa revela ainda que 71% dos respondentes admitem ter dificuldade em escolher as palavras certas ou encontrar o tom adequado entre o casual e o formal; 63% acreditam perder tempo tentando encontrar a melhor forma de se expressar e 56% sentem-se inseguros quanto ao tom a utilizar na comunicação interpessoal.

Esses dados são relevantes e devem refletir a realidade de diversos outros países. No entanto, é importante considerar a realidade brasileira e trago meu olhar baseado em quase 40 anos de experiência em projetos de comunicação e gerenciamento de crises. Percebo que a comunicação interpessoal é vista por muitos como um dom. Ou a pessoa nasce com ele ou não. Poucos reconhecem que esse processo pode ser aprendido tecnicamente. Não há relação com marketing digital ou técnicas de manipulação, mas sim com clareza e assertividade na mensagem, seja ela falada ou escrita.

Também noto que frequentemente o problema é atribuído ao outro: “Não fui eu quem não se expressou bem, foi o outro que não entendeu”. Repetir a mesma coisa da mesma maneira não resolve o problema. É necessário olhar internamente para identificar o que precisa ser ajustado no discurso. Afinal, estamos comunicando para o outro e não para nós mesmos. Nosso objetivo deve ser sempre alcançar a compreensão do interlocutor, adaptando o discurso conforme necessário.

Além disso, alguns indivíduos usam termos técnicos diante de públicos leigos intencionalmente para causar confusão, alimentando sua baixa autoestima sob a fachada de uma suposta superioridade intelectual. Esse tema será discutido em profundidade em outro artigo, abordando o fracasso de programas de extensão universitária e aulas de graduação devido a esses comportamentos.

A comunicação interpessoal também sofre quando nossas atitudes e expressões corporais contradizem nossas palavras. Pequenos gestos podem revelar incoerências, como alguém que não consegue ouvir e critica os outros por não ouvirem. A transferência de responsabilidade para o outro, em vez da autoreflexão, é um desafio comum.

Para não me alongar mais, encerro destacando outra armadilha na comunicação interpessoal: a armadilha do óbvio. Em sala de aula, costumo brincar com os alunos sobre o uso do termo óbvio dizendo que ele foi criado por um linguista que acordou mal-humorado e decidiu criar um termo que causasse confusão por onde quer que fosse utilizado.

Óbvio para quem? Por que algo considerado óbvio para você deveria ser para o outro? As experiências, referências e conhecimentos individuais diferem, tornando o conceito de óbvio subjetivo. Termos como óbvio, bom senso e calma podem prejudicar a comunicação eficaz e serão explorados em futuras discussões.

Finalizo a de hoje trazendo a brincadeira que faço com os alunos sobre o termo óbvio para uma percepção mais ácida: o quanto a armadilha de acreditar que tudo é óbvio revela no lugar de uma percepção aguçada uma demonstração de arrogância e autocentrismo?

Se o seu interlocutor não for alguém da sua profissão, do seu nível hierárquico e que viveu experiências semelhantes à sua qualquer menção ao óbvio não faz qualquer sentido em termos comunicacionais.

 


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