Brasileiro abre empresa, não empreende


A capacidade empreendedora do brasileiro vem sendo contestada mundialmente. É o que diz o Global Entrepreneuship Index anuário mundial sobre empreendedorismo publicado pelo Global Entrepreneurship and Development Institute, (Gedi) uma das maiores organizações mundiais voltadas para o tema. No ranking do empreendedorismo, o Brasil fica em 100º lugar, atrás de países como Gabão, Irã, Ruanda e Senegal.

O Irã que ocupa a 94ª posição em 2015 é apontado no levantamento como um dos que mais registrou evoluções no último ano subindo sete posições no ranking atrás apenas da Grécia que ganhou 10 posições em um ano e os Emirados Árabes que subiram 12 pontos e hoje já estão no clube dos top 20 mundiais em empreendedorismo. A centésima posição não coloca o Brasil na lanterninha. Estamos na frente da Venezuela, do Paquistão e do Burundi, entre outros. Mas o que coloca a 8ª economia mundial em uma posição tão questionável em um levantamento mundial?

Talvez que o nosso conceito de empreendedorismo não esteja alinhado ao que o mundo pensa a respeito. Enquanto ainda nos baseamos fortemente em conceitos que – quando sozinhos – podem ser muito rasos como "acredite no seu sonho" e "siga a sua intuição" tem muita gente lá fora empenhado em realmente aprender a empreender. E pagar o preço emocional desse aprendizado. A fórmula usada para calcular o ranking é complexa e o governo pode atrapalhar. Antes de entrarmos na zona de conforto acreditando que achamos o motivo que nos levou à centésima posição e nos colocarmos mais uma vez como vítimas, que tal refletirmos sobre os pilares do empreendedorismo que o Gedi considera? Dos 14 pilares que vamos apresentar as piores performances do Brasil estão em Capital Humano e Inovação, tanto de produtos quanto de processos. Isso porque como já tratamos anteriormente, brasileiro está muito mais para criativo do que inovador.
  1. Percepção de oportunidade – aqui são consideradas a taxa de urbanização e o potencial do mercado. Temos 85% de taxa de urbanização e uma população que nos últimos anos caracterizou-se pelo crescimento do consumo. É a nossa maior qualidade segundo o ranking
  2. Starup skills – que seria algo como habilidades ou conhecimento para tocar um negócio. Aqui ainda escorregamos e muito. Assim como em diversos outros países em desenvolvimento acreditamos na tentativa e erro, enquanto em países desenvolvidos a capacitação em negócios e gestão é muito mais valorizada não importa o tamanho do negócio.
  3. Aceitação de risco – Se por um lado muitos colocam todas as suas fichas no negócio – sem deixar uma reserva prudente ou colchão financeiro para lidar com eventualidades ou mudanças de rumo – por outro lado arriscamos sabendo pouco o tamanho desse risco. Apostamos sem calcular até onde nossa intuição e nosso esforço podem nos levar e o que pode aparecer no meio do caminho. Não sabemos interpretar o cenário econômico e não mapeamos de maneira eficaz o mercado e a concorrência. Coisa de economista? Não, para um pequeno negócio instituições como Sebrae ou Endeavor capacitam o suficiente para quem realmente está disposto a levar essa análise a sério.
  4. Networking – fazemos mal. Lembramos dela na hora da necessidade, focamos na quantidade e muitas vezes somos ou agressivos tentando forçar a venda ou o contrário, não aproveitamos a oportunidade
  5. Apoio cultural – contempla tanto a visão que os profissionais ativos têm do empreendedorismo como opção profissional quanto o suporte cultural de seu país para esse tipo de atividade. Como suporte cultural entende-se desde incentivos e capacitações diversas até aspectos da cultura ou realidade do país como a corrupção. Apesar do crescimento de entidades apoiadoras do empreendedorismo e algumas facilidades legais que surgiram nos últimos anos, o quesito corrupção joga muito contra nós. Não somente a corrupção do governo, mas a nossa cultura do "jeitinho', de acreditar que a Operação Lava Jato, a caixinha do guarda na estrada, usar um contato importante para passar na frente em alguma fila ou o uso de produtos piratas mesmo que de baixo custo não estão relacionados. Afinal, vivemos em um país em que os governantes são eleitos por nós e podem ser depostos também por nós.
  6. Empreender por oportunidade nem todos os profissionais autônomos ou donos de pequenos negócios, estão nessa situação por opção. Uma parcela considerável o faz por necessidade, seja pela falta de preparação para exercer uma profissão, pelo desemprego depois de uma determinada idade ou outro motivo. Isso não significa que o empreendedor por necessidade, quando bem capacitado, não possa dar certo. Mas, quando fazemos algo com motivação as chances são bem maiores.
  7. Tecnologia – dificilmente um negócio sobrevive sem ela. Empreendedor que não gosta de tecnologia precisa, pelo menos, ter algum parceiro ou alguém em sua equipe que goste e entenda. Entender significa muito mais do que saber usar as ferramentas, é conhecer o conceito e traçar estratégias a partir dele. Nesse pilar a participação do poder público também é bastante relevante tanto em relação à infraestrutura digital quanto em incentivos à aquisição de equipamentos. As ferramentas digitais de gestão, marketing e planejamento já não são mais problema. Há versões gratuitas ou de baixíssimo custo de excelentes ferramentas, inclusive em português. Hoje é possível gerir um pequeno negócio apenas com o que o Google oferece. O Brasil ainda carece de banda larga de qualidade em várias regiões, mas nos grandes centros só não é digital quem não quer
  8. Capital humano. Apesar de muito amigo e caloroso, o brasileiro gere mal a sua equipe. Coloca aspectos pessoais antes dos profissionais, contrata por simpatia e não por competência. Tem pressa ao contratar, o faz sem critérios e não tem coragem de demitir. O profissional brasileiro até que trabalha muito mas trabalha mal. São horas e horas dedicadas e um resultado que deixa muito a desejar em produtividade. O profissional brasileiro é o 61º em produtividade no mundo e foca mais no esforço do que em resultados.
  9. Concorrência a dificuldade do empreendedor brasileiro em lidar com a concorrência se dá por duas vias: a primeira é que ainda o pequeno empresário ainda investe muito nos mesmos negócios que grandes conglomerados empresariais, não conseguindo competir nem em preço e nem em prazo. E. quando investe .não tem muita clareza de como colocar seu diferencial. O outro ponto é que muitos produtos e serviços ainda são criados de dentro para fora, na base do “eu acho que isso aqui pode ser legal”, em vez de baseado em pesquisas, no que os outros fazem e no que o consumidor quer
  10. Inovação em produtos aqui nova confusão de conceitos. O brasileiro cria muito e por isso se vê como inovador mas não o é, pois sua capacidade de viabilização do que cria é baixíssima. Isso acontece tanto pela falta de valorização dos processos quanto pela criação do produto ou serviço ainda se dar com o olho interno: eu crio o que eu gostaria que o mercado comprasse em vez de eu vou primeiro entender bem o que o mercado quer para poder oferecer
  11. Inovação em processos – item bastante alinhado com a inovação em produtos. Há ainda uma grande dificuldade do brasileiro sistematizar seu trabalho. Os processos são pouco seguidos e valorizados. Inovar a partir do que não se entende e do que não se valoriza é quase impossível.
  12. Capacidade de crescimento totalmente ligado ao planejamento estratégico e à análise de riscos. Implica em o empreendedor projetar e atingir taxas de crescimento levando em conta todos os aspectos de seu planejamento estratégico e as alternativas. Em um país em que ainda muitos empreendedores acreditam que a intuição e o sonho valem mais do que o conhecimento, em um país em que remediar toma o lugar de prevenir a capacidade de crescimento das empresas fica muito comprometida, vide a taxa de fechamento de pequenas e médias empresas publicado pelo Sebrae.
  13. Internacionalização o mundo é cada vez menor, mas o Brasil não olha para ele. A baixa taxa de internacionalização das empresas brasileiras se deve principalmente à barreira do idioma Brasileiro não fala inglês.
  14. Capital de risco mais uma consequência da postura remediativa da cultura brasileiras. Boa parte dos empresários cresce por meio de endividamento. São poucos ainda que conseguem fazer um plano de negócios que seja atrativo para um investidor. Muitos ainda acreditam que basta uma boa ideia para alguém querer investir.
Enfim, sair da 100ª  posição exige muita renúncia, esforço e disponibilidade de mudanças. Quem vai encarar?

Comentários

  1. Interessante Karen. Faz muito sentindo mesmo.
    Acho que o brasileiro tem muito trabalho de base à fazer. ;)

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