
Sobre a “profissão” palestrante, é preciso tomar cuidado.
Uma boa palestra equilibra dois elementos fundamentais que são o conteúdo e a
forma. Pouco adianta gastar milhares de reais em treinamentos para palestrantes
se você não tem conteúdo, especialidade, enfim, não é um expert naquilo sobre o
qual fala. Copiar citações ou trechos de livros não faz de ninguém um
palestrante, e sim um imitador. É preciso ter propriedade, conhecimento sobre o
conteúdo.
Outro dia eu estava em um almoço de empresários em uma
renomada instituição paulista quando apareceu um homem por volta dos 40 anos, muito
bem vestido. Interrompendo a conversa mesa por mesa sem pedir licença, ele
entregou a todos um folheto convidando para uma palestra sua na semana seguinte
a um preço consideravelmente alto para alguém que não tem nome no mercado. Ao estender
a mão com o folheto ele dizia: eu fiz o curso de palestrantes de fulano de tal
(citando um dos mais famosos da área) e vou dar uma palestra aqui na semana que
vem. Na hora eu perguntei: a sua
palestra é sobre o curso de palestrantes? Ele pareceu surpreso e foi logo dizendo: não. Eu vou
falar sobre o tema X. Ahh....
Resolvi continuar a conversa: mas se a sua palestra é sobre o
tema X, por que você não nos convida falando um pouco do conteúdo do seu discurso
e da sua experiência na área, em vez de anunciar em qual escola de palestrantes
você se formou? O homem ficou mudo. Parecia que eu tinha pedido a ele para
resolver o maior enigma do mundo. Esse é um grande problema: vender a forma
quando não se tem conteúdo, quando o que se vai apresentar é a reprodução de
teorias que você nunca leu e são totalmente descoladas do dia a dia do público.
E ainda tem quem acredite que vai ganhar 10 mil reais por isso.
Por outro lado, surgem aqueles que acreditam que apenas ter
conteúdo basta. Não interagem com o
público, apresentam material de suporte sem qualquer atrativo visual e
perdem-se na sua expertise, acreditando que técnicas de oratória e de comunicação
visual não tem qualquer fundamento científico e não passam de “bobagens” que
vão interferir no “seu jeito”. Tornam-se desinteressantes e ainda saem falando
que o público não foi capaz de entender a profundidade do seu recado.
Conteúdo não é discurso de vendas
Recentemente a área de vendas descobriu o mercado das “palestras” como uma alternativa a investimentos em mídia tradicional. E desavergonhadamente transformou o que seria um meio para transmissão de conhecimento em uma oportunidade para, como se diz na área comercial, dar um “malho de vendas”. Anunciam uma palestra sobre um determinado tema a preços baixos ou gratuitas. E quando você chega lá, ouve alguém falar exaustivamente como “a empresa do palestrante” pode resolver todos os seus problemas. Traz um ou outro dado de mercado nos primeiros cinco minutos e depois dá-lhe autoelogio.
Não descarto o fato de a palestra ser um bom instrumento de
vendas. Desde que em uma hora no palco, o palestrante faça isso nos últimos
cinco minutos e não o contrário: abrir com cinco minutos de conteúdo relevante
e ficar outros 55 forçando a plateia a comprar alguma coisa ou a entrar em uma
pirâmide. Se a sua palestra tem conteúdo relevante, se o público sai de lá com
algum conhecimento agregado, pode ter certeza que a imagem da sua empresa já
foi feita. Não é necessário transformar uma proposta inicial de geração de conhecimento
em uma prospecção coletiva.
Diante disso surgem dois outros problemas: o excesso de
programações de palestras e a prostituição do mercado. Acostumados com os “palestrantes-vendedores”
muitos espaços para eventos querem transformar uma atividade profissional que
deveria ser paga em algo a ser feito de graça, ou pior, alguns locais –
renomados até - tentam cobrar taxas do palestrante dizendo que estão dando a “oportunidade”
de o palestrante vender sua empresa então para isso ele precisa pagar um determinado
valor.
Não sei qual será o futuro desse movimento. Mas sei da
satisfação que dá quando encontramos alguém que em algum momento esteve na
plateia, reconhece você e diz: nunca esqueci daquilo que você falou. Coloquei
em prática e me ajudou muito (ajudou... porque para mudar a vida de alguém é
preciso muito mais do que uma palestra).
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