A Liderança Servidora e o Caráter

Baseando-se nos princípios das duas obras de James Hunter: O Monge e o Executivo e Como se Tornar um Líder Servidor, é possível afirmar que liderança servidora funciona, dede que aplicada por alguém que está preparado para ela. Em diversos momentos ela pode ir de encontro - e não ao encontro - do que muitas pessoas esperam quando se tornam líderes. Na nossa cultura tradicional em que a história do nosso trabalhismo com estrutura vertical e trabalho quantitativo - a aspiração para uma posição de liderança vem carregada de expectativas irreais sob a óptica do líder servidor.
Vamos analisar alguns pontos: Um líder servidor precisa de paciência enquanto muitos ainda almejam poder apenas cobrar e exigir da maneira mais tradicional possível. Um líder servidor é gentil quando muitos ainda almejam cargos de liderança para poder mandar e determinar. Um líder servidor é humilde, enquanto muitos ainda têm como principal motivador na busca por cargos mais altos o status que podem alcançar, não apenas na empresa mas em outros ambientes de sua vida: familiar, social etc.

Mais do que uma habilidade técnica, segundo os estudos de Hunter, a liderança servidora é instrumento de revelação de caráter. Levando em conta as três características - e que não são as únicas - acima citadas em relação a um líder servidor, já podemos começar a confirmar essa afirmação de que a liderança servidora está ligada ao caráter. Será que aquele líder-chefe que se posiciona no alto o Olimpo manda, acredita que precisa ser obedecido e servido também se posiciona assim quando está diante do presidente da empresa ou dos Heads globais da companhia em que trabalha? Certamente que não. Então se ele sabe ser humilde, gentil e paciente quando necessário por que opta por não ser com sua equipe?

Nos exemplos de liderança servidora, nomes como Jesus e Gandhi são frequentemente citados. Que ambos movimentaram milhares de pessoas e as inspiram até hoje não há dúvida. O que havia de segredo no sucesso dessa liderança servidora e por que ela pode ser chamada de servidora?
Em primeiro lugar pelo propósito que era beneficiar o maior número possível de pessoas e não apenas um indivíduo ou um pequeno grupo. Outro elemento é o poder influenciador baseado por fortes características de caráter. Quando falamos em caráter e humildade, essas características em nada têm a ver com subserviência. Até mesmo Jesus quando precisou ser mais enérgico em algumas situações o foi, mas sem perder seus princípios, sua percepção do bem comum e do que considerada igualitário.

A liderança servidora também é um ponto de discussão interessante em relação ao atendimento ao cliente. Nas últimas décadas com o fortalecimento do direito do consumidor e a expansão e popularização dos meios de comunicação, principalmente digitais a excelência no atendimento se tornou princípio básico para o crescimento e até para a sobrevivência de uma empresa. Partindo do princípio que os empregados seguem - ou ao menos deveriam - seguir o exemplo de seus líderes ao praticar uma liderança servidora, esse gerente, diretor ou outro cargo da alta cúpula, está automaticamente ensinando sua equipe a se tornar excelente no ato  de servir, de atender bem. Dessa maneira, uma liderança servidora pode e tem efeitos no balanço comercial da empresa.

Conceitos ainda não muito bem definidos 


Outro ponto fundamental na liderança servidora - e que pode ser encaixado em todas as situações acima - é o respeito, conceito que os livros de Hunter traduzem como "tratar todas as pessoas com a devida importância". E quando falamos em todas, esse líder inclui a si mesmo, pois sabe da importância no grupo - e também a das outras pessoas. A importância exata, nem medida para mais, nem para menos. Aliando dois dos conceitos - humildade e respeito - podemos supor que o líder servidor precisa de duas outras características: autoestima e coragem.

É importante aqui não confundir o conceito de coragem com o de bravura. Conceitos esses que não tem relação um com o outro, apesar de serem constantemente confundidos e que tomo a liberdade de agregar percepções minhas às das obras de Hunter.  Como um ser com bravura posso descrever aquele que se expõe a altos riscos principalmente físicos e patrimoniais. A bravura de subir montanhas geladas, nadar com tubarões, atravessar um despenhadeiro sobre uma corda ou correr altos riscos em operações e aplicações financeiras ou negócios extremamente ousados.

Como coragem, prefiro focar naqueles indivíduos que conseguem olhar profundamente para si mesmos, encaram suas limitações e assumem seus erros sem achar que se tornarão menos respeitados ou menos líderes dessa maneira. Um exemplo é o recente caso da Toyota que teve vários de seus modelos, inclusive o tradicional Corolla passando por um recall mundial por um problema técnico. Em vez de transferir a responsabilidade para o fornecedor das peças, o presidente da Toyota enfrentou a imprensa e o Imperador o Japão trazendo para a si a responsabilidade e desculpando-se publicamente. Um ano depois o Corolla registrava novo recorde de vendas e voltava ao primeiro lugar do ranking de carros mais vendidos no mundo. Bravura e coragem raramente andam juntas. A primeira é mais fácil de encontrar e perceber, enquanto a segunda é mais sutil mas construída em bases mais sólidas e nem sempre barulhentas.

Talvez, aqui vá outra percepção pessoal: o conceito de líder servidor possa também estar em diversos momentos em outra obra de referência comportamental, "O Poder dos Quietos" de Susan Caine, no qual ela defende que a motivação e a inspiração nem sempre se encontram dentro do líder que faz o perfil "pop star", os quais ela questiona se a performance não seria uma maneira de ocultar os as lacunas deixadas pela falta de  embasamento emocional e técnico.

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